António Pires
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A derrocada do GES (Grupo Espírito Santo) veio confirmar que o plano de ajustamento, desenhado pela troika para o país, a fim de corrigir o défice público, padeceu de reduzida visão estratégica, espartilhando o governo a uma política económica pré-desenhada e negociada, embora fosse escassa a sua responsabilidade na situação económica e financeira do país. Segundo este plano, o problema do défice residia, quase exclusivamente, na orgânica do setor público, pelo que foram impostas medidas com enfoque nos funcionários do estado e nos reformados. Contudo, o setor privado, entendido como saudável, e que obviamente não está dissociado do público, ficou por acompanhar e ficou por reformar a atuação a que o estado se obriga no setor, mesmo tratando-se do privado, embora tenhamos assistido a um declinar e embora tenhamos tido a experiência calamitosa do BPN.
A derrocado do GES, grupo que vivia de transações e de negócios claramente megalómanos, põe a nu uma rede frágil de ações e influências pouco claras, que colapsou ao primeiro sinal da investigação Americana e Luxemburguesa, não nossa.
Há umas semanas, ouvia-se de Carlos Costa, Governador do Banco de Portugal, um discurso tranquilizador, garantindo que o Banco BES tinha uma almofada de liquidez para prever qualquer percalço. Alguns dias mais tarde, veio a saber-se que o buraco afinal era muito maior do que aquilo que se supunha e que, tenho de o concluir ou teria de presumir que o Governador do Banco de Portugal mentira, isto não seria do conhecimento do regulador. Os investidores que ouviram e confiaram em Carlos Costa perderam tudo no último fim de semana. Com isto, o Banco de Portugal contribuiu, uma vez mais, para nova estocada no mercado de capitais. Assim será difícil convencer o investidor comum a aplicar as suas poupanças em ações.
É certo que o investimento em ações e obrigações é de alto risco, mas, neste caso, quando os investidores começaram a pressentir a derrocada do GES o regulador, que podia ter estado calado, o que também seria mau, ou fazer o seu papel de controlar e alertar, tem uma atuação irresponsável, que os induz em erro, descredibilizando-se novamente. Como sucedeu com o BPN, parece existir uma inépcia na capacidade de atuação desta instituição, fulcral para o país, que os vários governos se têm esforçado por credibilizar e despolitizar, e em cujas projeções e ações reguladoras confiam como fiel das respetivas políticas financeiras.
Para além disto, aparentemente o Banco de Portugal só acordou quando se soube que outros países investigavam, numa fase em que a situação financeira do GES estava já extremamente debilitada, contribuindo para que, numa altura em que se devia revitalizar a bolsa nacional, impondo-a exteriormente, a falência do grupo provocasse o contrário.
Com toda esta embrulhada vem novamente à tona o problema da reforma do estado, não se sabendo bem se esta já foi realizada, está a ser ou virá a ser, isto para que o setor público seja tão eficaz quanto o privado!!!
O efeito da derrocada do grupo GES na economia nacional revelar-se-á mais penalizador que quaisquer ajustamentos nas reformas ou nos salários dos funcionários públicos, deitando por terra o esforço empreendido. Perante tal derrocada e a injeção de 4,4 mil milhões de euros do estado no fundo de resolução estranho não ter sido o governo a fazer a comunicação ao país.
Não fossem os ventos do exterior, daqueles que se sabem implacáveis e que acautelam verdadeiramente a solidez do mercado de capitais, e nada de muito relevante se passaria, passando despercebida ao país a situação moribunda de um dos maiores grupos económicos nacionais, por incapacidade de uma instituição. Continuar-se-ia o ajustamento do setor público ao setor privado, sem que ninguém percebesse que também nos grupos económicos que nos dizem ser de referência, há bons e maus exemplos, há bons e maus negócios, há bons e maus gestores.