Afirma que “não contava nada ser candidato, nem por sombras”, mas reagiu a uma “nota provocatória” do actual presidente da Câmara e hoje protagoniza o movimento de cidadãos independentes Narciso Mota – Pombal Humano. Uma candidatura de afectos, que pretende estar próxima das pessoas. Aos 70 anos, o agora Comendador diz que tem uma “vontade enorme de viver” e assume-se como um trabalhador acérrimo. “Quando parar é porque estou a morrer”, afirma.
Pombal Jornal (PJ) – No dia 7 de Maio do ano passado afirmou que era candidato, porque as estrelas assim o recomendavam. A que estrelas estava a referir-se?Narciso Mota (NM) – Estava a falar em relação a todos os munícipes do nosso concelho, que são inúmeros, que me interpelavam e me diziam que eu fazia muita falta ao executivo. Isto porque, o actual executivo não atendia com a devida oportunidade os munícipes e que também os tratava com alguma superioridade. Os trabalhadores da Câmara diziam-me muitas vezes ‘volta Narciso que estás perdoado’. Quando falavam comigo tinham receio que depois fossem chamados à atenção. Depois, o cidadão comum, anónimo, perguntava-me quando é que voltava.
PJ – Ou seja, estava a sentir força para avançar com uma candidatura…
NM – Essa ideia foi amadurecendo. Não contava nada ser candidato, nem por sombras. Eu sou um defensor acérrimo da limitação dos mandatos, mas para toda a gente. Quando fiz o terceiro mandato, falei com o meu primeiro vice-presidente [João Coucelo] para se candidatar. Em 2009 falei outra vez com ele, mas nunca se disponibilizou. Em 2005 pedi a reforma, estive durante os anos de 2012 e 2013 a receber apenas despesas de representação, poupando ao município cerca de 90 mil euros.
PJ – Mas quando é que decidiu que se ia candidatar?
NM – Foi depois de uma nota provocatória proferida pelo actual presidente, no fórum da JSD [7 de Maio de 2016]. Foi descabida, inoportuna, e até, de certo modo, inconveniente. Aquela provocação não teve sentido. Mas pedi para usar da palavra e afirmar que era candidato. E as palavras dos homens são para cumprir. A partir daí, fiquei com a preocupação de apresentar um projecto, de arranjar uma equipa de trabalho disponível.
PJ – Surgiu então o movimento Narciso Mota – Pombal Humano…
NM – Sim. De acordo com aquilo que a lei nos faculta. Um grupo de independentes, sem ferir susceptibilidades, sem ferir sensibilidades.
PJ – Mas teve consciência que tinha acabado de lançar uma “bomba”?
NM – Sem dúvida. Foi uma “bomba” e que mudou significativamente a acção, em termos de prioridades, do actual executivo. Foi benéfica, foi útil, e foi boa essa minha tomada de decisão. Eu conheço muito bem o actual presidente, como ele me conhece também a mim. Respeitei a decisão do meu partido. Andei por aí a dizer que ele iria fazer mais e melhor, mas infelizmente não fez mais nem melhor. Procurou pôr de parte muitos projectos, que ele tinha sufragado comigo. Só a partir do dia 7 de Maio é que começou a ter uma outra atitude, dando andamento a obras que já tinham projecto, pago, e condições para terem sido lançadas a concurso em 2013 e 2014.
PJ – O que sentiu ao ver um auditório cheio no momento de apresentação da sua candidatura?
NM – Senti uma certa felicidade. Vi lá pessoas de todas as tendências políticas e que foram lá livremente, porque é a democracia a funcionar.
PJ – Ao dizer que era candidato, recebeu apoios?
NM – Houve pessoas que mostraram o seu regozijo, a sua satisfação e que me felicitaram pela decisão. A maioria está comigo. Mas duas ou três que almoçaram comigo e disseram estar incondicionalmente ao meu lado, e até se disponibilizaram a indicar nomes para as listas, nos últimos tempos afastaram-se sem razões e que fizeram pressões junto de mim, e até queriam fazer junto da minha família, para eu não apresentar a candidatura. A minha candidatura não é contra ninguém. É legítima, legal, democrática e com objectividade. Sinto-me muito mais bem preparado e tenho uma projecção de vida e um relacionamento próximo dos munícipes, de mais afectividade.
PJ – Falou de uma candidatura de afectos…
NM – Sim, de afectos… Quero uma Câmara aberta, próxima das pessoas, que trate todos os munícipes com equidade, com justiça, com imparcialidade e com respeito pelas suas convicções. Faço parte de um grupo de cidadãos que vai apresentar um projecto para Pombal, e espero, efectivamente, que esse projecto vá mesmo ao encontro dos anseios e das necessidades dos pombalenses e que lhes traga mais alegria, mais auto-estima e melhores condições e qualidade de vida. Não esqueço pequenas falhas que o ser humano comete. A gente ao longo da vida está sempre a aprender. Nada é estático, tudo é dinâmico, tudo deve ser inovador e criativo. Quero ser mais perfeito, mais eficiente, mais construtivo.
PJ – Acha que tem faltado proximidade à actual Câmara?
NM – Eu penso que sim. Sinto isso no meu dia-a-dia. As pessoas vêem-me dizer que a Câmara não é uma Câmara próxima, não é uma Câmara autêntica, não é uma Câmara de realização, mas sim de culto de personalidade.
PJ – Como vai desenvolver a sua campanha eleitoral?
NM – As pessoas conhecem-me. Sempre fui o mesmo Narciso Mota e sempre serei. Vou dizer-lhes o que não fazia e que este executivo fez. Mas que temos de criar condições para que todos se sintam bem, que os jovens tenham uma vida sadia e se sintam realizados, nas actividades desportivas, culturais, sociais…
PJ – Acredita que é um projecto vencedor, portanto?
NM – Conheço o povo, o povo que servi durante 20 anos. Quero corrigir as falhas que cometi nos cinco mandatos que exerci, e quero fazer mais e melhor. Quem me conhece sabe que não sou de palavras, mas sim de acção, de determinação. Ao verem o meu programa de acção, as pessoas vão escolhê-lo e eu vou, com espírito de missão, exercer o mandato como presidente da Câmara, sem me servir. Nunca fiz nada na minha vida a pensar no meu proveito pessoal, fosse na actividade pública ou privada.
‘Não estou desiludido com o PSD, mas sim descontente’
PJ – Nunca conseguiu convencer o PSD que seria um candidato ganhador…
NM – Depois do dia 7 de Maio de 2016 escrevi uma carta aos órgãos nacionais, distritais e concelhios do PSD a dizer que estava disponível para ser candidato. Ninguém me respondeu. Foi preciso que eu me desfiliasse do partido, dias antes de apresentar publicamente a candidatura, no dia 27 de Janeiro, para que o Pedro Passos Coelho tivesse a amabilidade de me enviar um cartão manuscrito a agradecer-me pelo contributo que tinha dado ao partido ao longo destes 23 anos. Mas fui muita vez pressionado para não apresentar a minha candidatura.
PJ – Alguma vez transmitiu pessoalmente a sua intenção a Passos Coelho?
NM – Falei. Estive também na festa do PSD em Carnide e disse-lhe que ia ser candidato. Fui informado que iam fazer uma sondagem. Depois disse ao chefe de gabinete dele, se essa sondagem fosse favorável ao actual presidente da Câmara, eu não apresentaria a minha candidatura. Mas nunca fizeram nada, porque nunca me deram conhecimento.
PJ – Está desiludido com o PSD?
NM – Não estou desiludido com o PSD, mas sim descontente. Os partidos políticos são necessários para a democracia, mas convicções das pessoas também devem ser respeitadas, por isso é que vivemos num Estado democrático. Mas muitas vezes penso que não vivemos numa democracia plena. Vivemos numa partidocracia, pelo elitismo, pelo seguidismo que há nos partidos políticos, mas também na deslealdade que há nos partidos políticos. Eu não fui desleal com ninguém. Eu respondi a uma provocação e, em termos de cidadania e pela experiência que tenho, manifestei uma intenção. Fui o primeiro. Até fui benéfico para Pombal.
PJ – Não traiu ninguém, como o acusa a Concelhia do PSD?
NM – Não traí ninguém nem marginalizei ninguém. Não sou de ressentimentos nem de vingança com quem quer que seja. Esqueço tudo aquilo que é negativo. Nunca me zanguei com ninguém e sempre fui ao encontro das pessoas que comigo se zangaram. Mas também, em consciência o digo, procurei tratar todas as pessoas com lisura, fazendo observações, e quando às vezes era uma observação forte no momento, pedia desculpa porque o stress leva-nos a dizer o que vai na alma. Ninguém é infalível.
PJ – Apresenta-se como um Narciso Mota mais experiente….
NM – Muito mais experiente. Com muita mais maturidade, muito mais calmo. Na Assembleia Municipal tenho vindo a ter mais calma. Por vezes nos momentos de impulsividade já me controlo. Vou ser muito mais de afectos, muito mais atencioso. Vou dedicar-me exclusivamente à missão de ser presidente de Câmara como fui durante 20 anos. Gostei de ser, gosto de ser, e gosto de ser um presidente de mais proximidade e amigo das pessoas. Não me preocupo se as pessoas são empresários, cantoneiros, doutores e engenheiros, hei-de tratar as pessoas com mais afecto, com mais proximidade, com maior diálogo, com calma.
PJ – Vai apresentar candidaturas a todas as freguesias?
NM – Estamos a trabalhar para apresentar candidaturas a todas as juntas de freguesia. Acho que Narciso Mota – Pombal Humano é uma candidatura para todo o concelho, e este projecto é de um grupo de pessoas, vai ser melhorado com o enriquecimento dos nossos candidatos as juntas de freguesia que têm um poder de proximidade maior que o presidente da Câmara.
PJ – E quanto à sua lista?
NM – Tenho nomes. Graças a Deus pessoas disponíveis para servir o concelho. Com diálogo e quando for oportuno a equipa será apresentada. Assim como a lista para a Assembleia Municipal e para as 13 juntas de freguesia.
‘Não deixarei de ser deputado municipal’
PJ – Está preparado para ser destituído da presidência da Assembleia Municipal?
NM – Estou preparado porque a política é mesmo assim. Democraticamente fui eleito para ser presidente da Assembleia Municipal, mas aceito, também democraticamente, aquela que for a decisão dos deputados municipais, mas tem de ser em voto secreto, livre e espontâneo. Eu sou o mesmo Narciso Mota, não mudei de personalidade, sou o mesmo social-democrata convicto, apesar de ter deixado de ser militante e passar a independente.
PJ – Também em 1993 se candidatou como independente…
NM – Sim, candidatei-me como independente. E não foi fácil convencerem-me a ser candidato à Câmara, estava numa empresa privada a ganhar o dobro do que fui receber, mas não foi por isso que deixei de ir servir, com isenção e honestidade, o meu município. Nunca fiz nada, nem na actividade pública ou privada, em benefício próprio.
PJ – Mas se for destituído da presidência da Assembleia Municipal…
NM – Como disse, posso não concordar, mas aceito. Não há motivo nenhum para que tomem essa decisão. Não deixarei de ser deputado municipal, e se calhar até serei mais crítico estando sentado na bancada do que na cadeira da presidência. Nunca prejudiquei qualquer crítica, observação ou opinião de qualquer um dos deputados que falaram nas sessões. E a nossa Assembleia nunca foi tão plural, tão rica, como é agora, que tem todas as forças políticas representadas. Cada um terá de assumir as suas responsabilidades, eu assumirei as minhas.
PJ – Portanto, tem sido um presidente isento?
NM – Sempre tive, na minha função de presidente da Assembleia Municipal uma total independência e isenção. Tive até a preocupação de nunca cortar a fala ao actual presidente da Câmara, ao contrário do que acontecia comigo porque excedia sempre o tempo e não me deixavam responder a todos os deputados. Agora não faço o mesmo, embora imponha o cumprimento do regimento. Nunca distingui qualquer deputado municipal, de qualquer uma das bancadas, e procurei sempre que o executivo tivesse tempo para prestar todos os esclarecimentos.
PJ – E teve dois deputados municipais do PSD ao seu lado, na apresentação da sua candidatura…
NM – A doutora Ofélia Moleiro e o engenheiro Rodrigues Marques foram sempre meus amigos. Sempre estiveram comigo e espero que continuem a estar. São pessoas com muita experiência de vida e com muita experiencia politica, até mais que a minha. Foram presidentes da Concelhia do PSD, foram deputados à Assembleia da República, e são deputados municipais. São pessoas muito cordiais, respeitadas e respeitadoras.
‘Vontade enorme de viver’
Narciso Ferreira Mota nasceu nas Meirinhas há 70 anos. Casado, pai de dois filhos e avô de quatro netos, licenciou-se no curso de Electrotecnia e Máquinas, no Instituto Superior de Engenharia de Lisboa e, em Máquinas (construções mecânicas), no Instituto Superior Técnico de Lisboa.
Em 1993 candidatou-se à presidência da Câmara Municipal de Pombal, conquistando para o Partido Social Democrata a autarquia que estava “nas mãos” do Partido Socialista. Uma vitória repetida, sucessivamente, nos actos eleitorais seguintes, até 2013, quando por imposição da lei de limitação de mandatos, não se podia recandidatar. Foi eleito presidente da Assembleia Municipal. Em Novembro do mesmo ano, a Câmara Municipal atribuiu-lhe a Medalha de Mérito Municipal, em Ouro, “pelo seu elevado sentido de entrega ao serviço do próximo e da sua comunidade” e “pela exemplar acção desenvolvida ao prol do concelho e das suas freguesias”. Recebeu, ainda, das mãos do então Presidente da República, Cavaco Silva, a Comenda da Ordem do Mérito.
De outras funções, actualmente preside às assembleias gerais da Cooperativa Agrícola de Pombal e da Filarmónica Artística Pombalense. É membro do Conselho Consultivo do Centro Hospitalar de Leiria e preside à Assembleia Intermunicipal da Comunidade Intermunicipal da Região de Leiria.
Assume-se como um trabalhador com uma “vontade enorme de viver”. “Quando parar é porque estou a morrer”, confessa. Diz, ainda, que “contava tanto ser candidato como contava ir agora para a Síria”. Mas, “forças das circunstâncias” fizeram com que rompesse com o PSD, do qual era militante desde há 23 anos, e protagonize uma candidatura independente à presidência da Câmara Municipal de Pombal, disputando, assim, as próximas eleições autárquicas, apresentando-se ao eleitorado o projecto “Narciso Mota – Pombal Humano”.
Entrevista publicada a 23 de Fevereiro de 1017, na edição n.º 101 do Pombal Jornal.