Tal como aconteceu em 2013, Fernando Domingues, volta a ser o cabeça de lista da candidatura da Coligação Democrática Unitária (CDU) à presidência da Câmara Municipal de Pombal, nas eleições de 1 de Outubro próximo. Durante a entrevista concedida ao nosso jornal, um dia à noite na sede do grupo de trabalho do PCP, o candidato fala do concelho. Mas, em muitas respostas dava o exemplo da situação vivida com os baldios e a exploração de inertes na sua terra, o Barrocal. É que Fernando Domingues foi eleito, recentemente, presidente do Conselho Directivo da Assembleia de Compartes. Mas, também da agricultura, da defesa dos pequenos produtores…
Pombal Jornal (PJ) – Vai a votos pela segunda vez, será desta?
Fernando Domingues (FD) – Vou a votos já pela terceira vez, porque já tinha sido candidato à Junta de Freguesia de Pombal. Depois, é que os camaradas da CDU me propuseram para ser candidato à Câmara Municipal, e para projectos destes estamos sempre disponíveis para poder dar a nossa colaboração, o melhor que sabemos e podemos. Vamos ver, não temos a pretensão e não vamos transformar este debate e este acto eleitoral num tudo ou nada. É mais uma etapa de trabalho sério por todos, porque é uma forma de fazer valer os pontos de vista da CDU.
PJ – Quais são as expectativas para 1 de Outubro?
FD – Pensamos que vamos ter condições para aumentar o número de votos, e quiçá, o número de eleitos. O trabalho que temos desenvolvido ao longo destes quatro anos, pese embora a pouca representação, mas muito cuidada, porque em cada uma das assembleias municipais temos tido participação, pode ser discutível com mais ou menos qualidade. Repare que já conseguimos fazer aprovar moções por unanimidade na Assembleia Municipal sobre assuntos e temas que são importantes para a população do concelho…
PJ – Mas quanto a objectivos…
FD – O nosso objectivo é aumentar, de facto, o número de votos e de participação. Se for eleito vereador, cá estaremos. Como pode imaginar, não é uma coisa que esteja no horizonte imediato. Não nos deixamos ficar entusiasmados. É um trabalho que vem continuando, ao longo dos anos e mais dia menos dia acho que vai ser possível. Se o povo entender que merecemos a qualidade do voto, na boa, estamos lá, dispostos a debater-nos por o que é importante numa perspectiva de melhorarmos a vida do concelho que tão necessário é. Achamos que há condições que não se compreendem e têm de ter uma alteração qualitativa no futuro para termos um concelho melhor, com mais emprego, com mais qualidade e fixar aqui gente. O que se está a passar no concelho é uma desertificação.
PJ – O PCP tem sido critico em relação à agregação das freguesias…
FD – A reforma administrativa criada pelo anterior Governo visou limitar o Poder Local, criando dificuldades às pessoas, distanciando-as do Poder Local, na perspectiva de poupar, mas está aí à vista que foi um erro, na nossa opinião. Na zona Oeste do concelho, contrariamente à opinião do presidente da União de Freguesias correu lá um abaixo-assinado popular por descontentamento. Não há dúvidas que o Poder Local se afirmou por autarcas que, muitas vezes não ganhavam para a bucha, mas que durante anos e anos lutaram por melhores caminhos, melhor saneamento, fornecimento de água, limpeza de caminhos, enfim… tudo o que consta no caderno de encargos de um autarca. Agora, temos de ver porque as pessoas protestam. Também ali na zona de Santiago de Litém e Albergaria dos Doze não é consensual aquela junção de freguesias. Para se apurar bem este deve e haver o povo deveria ser chamado a pronunciar-se.
PJ – Ou seja, fazer-se uma avaliação profunda?
FD- O PCP acha que efectivamente está longe de ter sido feito um bom trabalho com essa agregação de freguesias, ter resultado num bom trabalho na defesa dos interesses das populações. Antes pelo contrário, colocou mais problemas. Sabemos que os orçamentos são limitados, mas não houve reivindicações muito concretas para as populações. Essa reforma administrativa não resolveu problema nenhum.
PJ – Está a falar de que tipo de problemas?
FD – As pessoas sabem que nós fizemos comunicados, abaixo-assinados sempre dentro dos parâmetros do que defendemos o que deve ser o Poder Local. Em mais de 40 anos de Poder Local Democrático não foi resolvido o problema do saneamento básico. Passa de orçamento a orçamento. Naquilo que é fundamental, que traz qualidade de vida, é parca a decisão. Será justo que pessoas que têm reformas baixíssimas tenham de pagar 300 euros para fazer a ligação ao saneamento básico? E a maior parte das pessoas acaba por não ficar ligada, porque não há escoamento, tendo de investir depois em bombas eléctricas.
PJ – Na sua opinião, o que tem faltado ao actual Poder Local para resolver essa problemática?
FD – Tem faltado o entendimento que isto é um serviço público a prestar à população.
PJ – Com a cumplicidade do Partido Socialista?
FD – Com certeza que sim. Por exemplo, nós assistimos na penúltima Assembleia Municipal, em que tivemos duas moções do PCP aprovadas, o Partido Socialista a criticar. Faz bons juízos em relação a uma prática política do PSD, mas depois acaba em zero, a votar a favor ou a abster-se. Outro exemplo, na Assembleia de Freguesia de Pombal que se realizou nos Matos da Ranha para apresentação das contas, depois de críticas justas e contundentes sobre vários aspectos que o PS fez, de seguida absteve-se.
PJ – Falta uma oposição forte em Pombal?
FD – O trabalho do Partido Socialista sempre foi alinhado com perspectivas de direita, pontualmente com propostas subscritas e aprovadas por todo o Executivo. O PS não se pode queixar de não haver à sua volta pessoas, como os comunistas, que propõem coisas muito concretas, e que podiam olhar para essas propostas e deslocar o seu centro de convergência para o social. Têm uma prática política muito em convergência com a direita. É necessário investir em todo o quadro funcional da Câmara, para não se acabar como naquela questão da indemnização relativa ao muro de Abiul em que há um prejuízo para os munícipes de 507 mil euros, com desculpas da parte da Câmara que foi o gabinete jurídico que errou. Não pode ser assim, é uma história mal contada, como está mais que provada. O PS nessa altura certamente que soube do desenvolvimento de toda aquela situação, até porque tem vereadores no Executivo, mas não conhecemos denuncias por parte deles.
PJ – Foi um acto de má gestão autárquica?
FD – É incúria, é má gestão, é falta de respeito pelo dinheiro dos munícipes. Isso é absolutamente. Segundo opinião técnica de juristas, a Câmara gastou mais uns milhares de euros em recursos que não trariam resultados. E isso é também incompetência.
PJ – Dá, portanto, uma nota negativa ao PSD, mas também ao PS?
FD – O PS tem responsabilidades, embora não determinantes. Mas, o PCP não tem eleitos na Câmara Municipal e não é por isso que deixa de fazer propostas. Claro que avaliamos mal a postura do Partido Socialista. Contudo, a principal responsabilidade é do PSD que tem conduzido os destinos deste concelho. Estou a lembrar-me da postura de Narciso Mota que foi presidente durante 20 anos e agora apresenta-se como possível candidato, naquela perspectiva de Pombal Humano. Ok, está bem. Na perspectiva de promover a ordenação e gestão dos baldios? Coisa fantástica. Está a viver num país diferente, com legislação diferente. Não conhece, ou não quer conhecer, a legislação que existe. Esquecem-se do prejuízo que provocaram às populações, ao abotoarem-se com milhares e milhares de euros de rendas pela exploração de inertes…
PJ – E na sua opinião isso deve-se a quê?
FD – A um abuso do município. É ilegal chamar a si a gestão dos baldios. Mas também a uma falta de zelo em não ver as condições em que tal exploração existe… há documentos escritos em como o presidente da câmara não reconhece a Assembleia de Compartes que é a entidade a quem compete gerir os baldios…
PJ – Daí a importância da CDU estar representada no Executivo?
FD – A CDU é um espaço aberto de comunistas, e não comunistas, e de Os Verdes. Mas temos um traço comum, a defesa intransigente dos interesses das populações. Não é de alguém das populações, é das populações. Apoiaremos sempre atitudes de progresso, que defendem uma economia social, a fixação das pessoas, a agricultura familiar e a pequena produção. Depois, temos outro problema que é a falta de mercados para o escoamento dessas pequenas produções… temos mercados sem condições, que não cumprem as mínimas regras de higiene. Há um mercado no Louriçal que é espectacular, mas condições para se trabalhar não tem. É tempo de se criar infra-estruturas para as pessoas. Levanto aqui uma questão, porque é que a Câmara de Pombal não valoriza a zona DOP do Queijo Rabaçal? Ou qual é a razão porque não é apoiada a criação de gado ovino e caprino, que seria uma mais valia que poderia dar a este concelho? Temos produções tradicionais da Serra do Sicó, onde predomina o chícharo, o tremoço, a batata, o azeite, o mel, a olivicultura, que não é tratada com pés e cabeça.
PJ – Como vai desenvolver a sua campanha eleitoral? No contacto directo com as pessoas?
FD – Vamos valorizar a campanha eleitoral no contacto directo, vamos ter um programa como se impõe, vamos olhar naturalmente para o concelho com algumas preocupações dado aquilo que aconteceu nos últimos anos em termos de política central e tão mal seguido pelo executivo municipal.
PJ – E como vê o surgimento de oito candidatos à Câmara?
FD – Para já não temos oito candidatos. Temos oito apresentações de candidatos. Por nós, garantimos que no dia 27 ou 28 deste mês teremos todas as nossas candidaturas entregues no tribunal para as formalizar. Posso dizer a talhe de foice, e de martelo, já agora, que se calhar isso revela o profundo descontentamento que reina no concelho com a actividade política de direita. Ainda não apareceu claramente a justificação política de cada um dos potenciais candidatos, sabemos em alguns casos os traços gerais das ambições politicas que têm, temos posição política sobre isso, sobre outros vamos aguardar. Os munícipes são capazes de avaliar quem é quem, porque há um historial de trabalho, goste-se ou não, e sobre algumas pessoas que estão perfiladas vamos ver o que vão dizer, do que fizeram a gente não conhece.
“Temos opinião critica que não vemos em mais ninguém”
PJ – A CDU tem um historial de trabalho no concelho para que as pessoas possam avaliar?
FD – Exactamente. De muitos anos. Esperamos que os munícipes o avaliem.
PJ – Como é ser-se comunista num território maioritariamente social-democrata?
FD – Temos um princípio que está por aí nos cartazes, colados nas paredes, que passa muito por aí: honestidade, trabalho e competência. Serve para afirmar o que achamos que é muito importante para a afirmação de um programa político, que neste caso não é do Partido Comunista Português, mas sim da Coligação Democrática Unitária. Ser comunista é conseguir unir as várias sensibilidades dos sectores e das classes sociais que existem no nosso concelho, perceber a origem dos problemas, ter uma resposta global para cada situação, descer às vezes, até à especialidade dentro de uma área para termos melhores respostas. Penso que não é por vaidade que vamos dizer que temos trabalho e temos opinião critica que não vemos em mais ninguém. Ser comunista é ir ao fundo das questões.
PJ – E os jovens? Como pretende cativar a atenção dos jovens?
FD – Repare, o desemprego juvenil é grave, assim como a taxa de abandono escolar… não é justo abrir-se turmas, como foi durante vários anos, em colégios privados quando os equipamentos oficiais de escolas, só há dois anos tinham vagas para mais de 2.400 alunos no concelho de Pombal. Houve alguma moralização nos últimos tempos e de poupanças de custos e de gastos… Agora, é preciso potenciar o sistema de ensino de condições e de cursos, que se calhar podem ter grande importância para a zona. Para fixar pessoas e para que os jovens cá fiquem é preciso criar emprego, sem precariedade… era interessante saber quantos jovens até aos 30 anos saíram de Pombal porque não tiveram emprego cá e não se vislumbram qualquer solução. O que é necessário fazer? É criar condições. Mas, por exemplo, olhamos para a Zona Industrial da Formiga e… aquilo não é nada.
“Cometemos um feito que muita gente dizia que não”
PJ – Há quatro anos a CDU conseguiu eleger um membro para a Assembleia Municipal, surpreendendo alguns…
FD – Cometemos um feito que muita gente dizia que não. Elegemos o grande camarada Jorge Neves, a quem reconhecemos mérito e trabalho pelo que tem feito. E pelo trabalho que desenvolve também na sua profissão. É uma pessoa conhecida, de bom trato e afável.
PJ – Foi uma eleição importante?
FD – Penso que depois de 30 anos de não termos um eleito em qualquer órgão autárquico, foi muito importante. Por muito pouquinho que possamos contribuir para uma alteração profunda qualitativa da politica autárquica no concelho de Pombal, temos consciência que alguma coisa temos tido capacidade, E penso que isso leva-nos a dizer às pessoas que exijam. Porque é da exigência que a democracia se faz. Não é com facilitismos, não é com populismo, não é dizer que todos somos iguais. Não somos de facto. Nem todos somos iguais dentro dos partidos, nem todos os partidos são iguais.
PJ – Mas os políticos estão descredibilizados…
FD – …é absolutamente fundamental para dar crédito a uma politica que é, muitas vezes, complicada. As iniciativas que tivemos em Pombal ao longo destes quatro anos, com deputados europeus a virem cá, tratar de questões sobre a agricultura, do desenvolvimento, do euro, da divida e dos juros… questões que são extremamente estruturantes… e não a reforma do Estado como o PSD sempre fez e diz. Não é a municipalização, é a regionalização. A municipalização não resolve problemas nenhuns porque ninguém garante verbas, abre precedentes, de um certo clientelismo, não há critério, porque muda também com a gestão de Câmara, enquanto uma regionalização tem órgãos eleitos e funciona com orçamentos. Estamos dispostos a colaborar para aprofundar o debate e a discussão em torno dos grandes debates locais.
PJ – E a CDU luta por quê?
FD – Lutamos pela desertificação, por uma economia social, pela defesa dos mais pequenos, e precisamos de debater isso, para continuarmos a ter concelho, a Serra do Sicó e tudo mais. Não precisamos de predadores, não precisamos das grandes superfícies económicas que esmagam os preços aos pequenos produtores. É preciso que certas estruturas, como a Cooperativa Agrícola, estejam ao serviço dos pequenos produtores, apoiando-os. Todo o resto é cavar a sepultura das pessoas, não é reavivar o concelho.
Comunista desde os 16 anos
Fernando Domingues tem 60 anos e desde os 16 com actividade política “sempre ligada” ao Partido Comunista Português (PCP). Natural do Barrocal, na periferia da cidade de Pombal, o jovem Fernando foi estudar para Leiria e, depois, para Coimbra. Frequentou dois anos o curso de engenharia civil no Instituto Superior de Engenharia. Ao longo da sua vida, tem uma actividade profissional vivida em vários sectores, tendo sido metalúrgico e funcionário de uma companhia de Seguros. Hoje é um pequeno empresário de produtos alimentares. Mas também no movimento associativo, onde recentemente foi eleito para o Conselho Directivo da Assembleia de Compartes. Para além de ter ajudado a fundar a associação da sua terra (AJEC) também tem o seu nome associado a várias secções da Associação Académica de Pombal. Fez teatro e foi jogador de futebol no Sporting de Pombal. Mas acabou por ser no atletismo que subiu mais vezes ao “podium”, conquistando algumas medalhas em provas nacionais. Ao nível político, diz lembrar-se “muito bem” dos “carros muito pretos e com figuras tipo urubus ou corvos, sem ofensas para os corvos, que entravam para a Câmara Municipal em 1972”. Assim como das vezes que fugia com o seu pai, de bicicleta, dos “bufos da PIDE”. Talvez por isso, diga com certo orgulho que sempre teve uma “actividade política intensa”, sempre alinhada com os princípios e as estratégias do Partido Comunista Português. Tem um filho de 28 anos, licenciado em Geografia “a trabalhar no Porto” uma vez que “não arranjou emprego por cá”, afirma.