A Oficina Xadrezista & Cultural Marquês de Pombal/JRSF está a promover um ciclo de homenagens a algumas das maiores figuras do xadrez nacional e internacional. A iniciativa está agendada para 22 de Abril com a realização, em Pombal, do torneio de homenagem ao campeão europeu António Fróis. A pretexto deste evento, entrevistámos o mestre internacional, jogador, professor e dirigente associativo, para tentar perceber como é que a paixão pela modalidade despoletou foi o ponto de partida para uma carreira que faz dele o único em Portugal com o estatuto de profissional.
Como surgiu a paixão pelo Xadrez?
Ocasionalmente em Vila Franca de Xira, onde nasci. Foi na Amadora, com 14 anos, que apareci na Académica da Amadora e joguei o meu primeiro torneio de xadrez. Ganhei-o ocasionalmente e isso levou a federar-me em 1976.
Depois de ter sido campeão da Europa de Veteranos de Rápidas em 2014, a Oficina Xadrezista & Cultural Marquês de Pombal vai fazer-lhe um tributo. O que acha desta iniciativa?
Agradeço a iniciativa e espero que consigamos dar uma boa e positiva imagem do xadrez. Eu acredito muito no xadrez, como uma actividade tão boa para a sociedade como qualquer outra e, portanto, viável como profissão, desde que levada a sério.
De certa forma o Mestre e a Oficina são pioneiros em aliar arte e cultura ao xadrez, assim como a introdução de palestras e mini-aula nos torneios jovens. O que acha deste projecto?
Tem sido uma boa forma de comunicar com os jovens e com os seus pais transmitindo-lhes um pouco da nossa forma de pensar.
O que recorda do passado e como perspectiva o futuro?
Joguei profissionalmente durante 25 anos, mais de 100 partidas lentas por ano, mais torneios de rápidas e semi-rápidas em mais de 30 países. Ganhei a única medalha de Ouro por equipas da Selecção Nacional em Hammamet, na Tunísia, em 2006. Fui Campeão dos Bancos Centrais Europeus pelo Banco de Portugal, no ano 2000, em la Rochelle, França. E Campeão Europeu de Veteranos de Rápidas em 2014, o que me fez ser distinguido pelo Instituto do Desporto de Portugal. Levei sempre o xadrez a sério. Sou profissional desde 1984.
Acontece que a sociedade portuguesa respeita mais um professor de xadrez do que um jogador, e a partir dos 45 anos resolvi dedicar-me mais à formação, à escrita , a direcção dos clubes com quem trabalho, mas continuo completamente dedicado à modalidade.
“Conhecer Pombal à boleia de um xeque-mate” é o tema base dos eventos realizados pela Oficina. Acha que este é um trabalho que pode dar frutos?
Todos os projectos são possíveis, mas é preciso criar condições concretas para os fazer.
Fale-nos dos seus projectos.
Já fiz quase tudo na modalidade. Pode-se ensinar e, sobretudo, divulgar xadrez nos espaços mais variados. Em 2006 estive no Estoril Open de Ténis durante os nove dias do evento. Foi interessante partilhar o ” Fun Center ” do Estoril Open com muitas outras actividades lúdicas e conseguir mostrar as diversas facetas do xadrez quando inserido num espaço multi-desportivo. Trabalho regularmente em três distritos deste país e desloco-me a outros com frequência. Treino semanalmente cerca de 100 xadrezistas em todo o país, mais a ligação à Escola de Xadrez de Pontevedra e à Universidade de Vigo, meu actual clube em Espanha.
Na Academia de Xadrez de Gaia fazemos a Revista GAYACHESS, que vai sair este ano pelo terceiro ano consecutivo. Gostava de escrever mais livros e gostei bastante da experiência de capitanear a Selecção Nacional na Olimpíada de Baku.
O que falta no xadrez nacional?
Há cerca de 25 anos atrás defendi que estrutura da FPX tinha de ser profissional para dar uma resposta mais cabal aos problemas de crescimento que o xadrez atravessaria. No mundo, a FIDE (Federação Internacional de Xadrez) é a terceira Federação com mais países federados, a seguir ao futebol e ao atletismo, o que demonstra a enorme força do xadrez no nosso planeta. Só com uma estrutura profissional se consegue responder eficazmente a tamanhos desafios.
O Xadrez Nacional precisa de atitude positiva de toda a gente e atitude profissional. Mostrar uma imagem forte e de união. Só assim se poderá caminhar numa sociedade competitiva.
O xadrez escolar está no bom caminho?
O xadrez escolar devia estar mais ligado ao federado.
Que projecto lhe falta realizar ou gostaria de realizar?
Gostaria de poder chegar às televisões e à Assembleia da República.
Pombal capital do xadrez, tendo em conta a sua situação geográfica e acessibilidades. Seria viável?
É um sonho bonito. A questão é como fazer os eventuais apoiantes das vantagens para a cidade de apoiar esse sonho.
Leiria tem alguns jovens de excelente qualidade. Qual o conselho a dar a esses jovens para singrarem no xadrez nacional?
Acho que quem quiser progredir a sério tem de trabalhar duro, estudar muito e jogar todo o tipo de torneios. As competições portuguesas não preparam os jovens para a dureza internacional.
O Mestre é descrito como um todo terreno: jogador/treinador/dirigente. Pode-se descrever nas várias funções?
Como Treinador gostaria de falar num trabalho que fiz a partir de 2007.
Fiz o FIDE Trainer em Outubro de 2006 na Alemanha. Por indicação do Grande Mestre Yuri Razuvaev comecei a estudar e a escrever sobre ” Os Meus Grandes Predecessores” de Garry Kasparov.
A partir daí, criei um trabalho que pretende ser um guia de trabalho para os meus alunos, baseado nas partidas ” modelo ” jogadas pelos melhores jogadores da História. A ideia é que os alunos sigam, sob a minha orientação, várias partidas sobre um determinado tema , até que o interiorizem.
Pombal continua a apostar na Arte vs Xadrez. Ou seja: premiar os xadrezistas que participam nos seus eventos com Obras de Arte personalizadas. Algumas de valor incalculável, como foi no último Open Internacional de Pombal, onde o GM António Fernandes levou três obras que a serem avaliadas tornaria o Open Internacional de Pombal num dos mais aliciantes da Europa. Será que os participantes têm noção do valor das obras ou preferem receber 3 a 5% em dinheiro?
Tem a ver com o que as pessoas valorizam. Uma obra de arte pode ter um valor muito interessante, mas se um jogador for profissional, jogar é o seu modo de vida e a obra de arte não irá de encontro aos seus objectivos de subsistência, o que não lhe retira o valor.
Estamos numa sociedade muito virada para o concreto!
O Mestre será agraciado com uma obra de Ilda Teixeira. O que lhe vai na alma?
É um grande orgulho e emoção. Agradeço imenso terem-se lembrado de mim e do meu trabalho.