Nos últimos tempos, têm-me chegado ao consultório imensas pessoas assustadas com a sua vida mental – “Dr.ª, não sei o que está a passar comigo! Já tive que lidar com muitas coisas difíceis na minha vida e sempre consegui dar a volta por cima. Não percebo porque é que desta vez não estou a conseguir sair disto… desta angústia!”. Para além de intensamente dolorosa, esta “angústia” é descrita como um conjunto de sensações avassaladoras que irrompem pelo peito e alteram a respiração, fazendo-se acompanhar de uma sensação de vazio que preenche uma mente negativista e que gera uma apatia difícil de contornar… “Pela primeira vez na minha vida, não me apetece lutar; não me apetece fazer nada… e parece que já não sou eu”. É assim que a depressão parece entrar na vida de muitos de nós! Vai-se impondo devagarinho e sem ser muito vista, gerando cansaço e uma inquietante sensação de não nos reconhecermos na nossa própria pele.
Na psicoterapia, o difícil não é identificar estes sinais e sintomas. O complicado parece-me, cada vez mais, desativar a luta para com estados semelhantes ao descrito! Sei que a depressão dói, não só no próprio corpo como no dos que nos querem bem. Mas não parece ser esta dor que mais inquieta… o que parece desorganizar é a sensação de perda de controlo sobre a vida e sobre o querer que se parece esvair!
“Ajude-me a sair disto porque eu não quero estar assim… não aguento deixar de querer, de tentar, de lutar… aprendi toda a vida que deprimir era coisa de gente fraca”. Ouço esta expressão com uma frequência que me inquieta e que me faz questionar seriamente o que nos andam a ensinar sobre o que é viver!
Porque deprimimos afinal? Não será certamente para vermos a nossa fraqueza refletida na dor que esgota… e não será também para deixar a vida entregue aos outros! Deprimimos porque a vida está muito difícil… porque o sofrimento psicológico não é amplamente aceite e compreendido… porque, e talvez depois de lutarmos durante tanto tempo, estamos cansados e precisamos entregar, ainda que momentaneamente, o rumo da nossa vida ao seu próprio fluir! Aprender a deixar a vida fluir será talvez a grande janela de oportunidade trazida pelo estado depressivo… um deixar fluir que nos permitirá reaprender a viver com a dor e com as grandes dificuldades da existência!
Mas de quem é a culpa? Talvez morra solteira… é certo que não temos para connosco a mesma tolerância que conseguimos intuitivamente para com o outros; é certo que percebemos melhor quando alguém muito querido nos assume que anda em baixo! Mas lidar com o estado depressivo é gerir um conjunto de “forças maiores” que foram aparecendo sem convite e sem escolha! A mente tem regras próprias, muitas delas difíceis de descodificar! E uma vez que não obedece à lógica mais linear, deixemo-nos de questões e expressões sem sustento: “Não percebo porque estou assim, se pouco me falta…”
Reconheçamos que, como se diz por aí, o que a mente não consegue organizar sozinha transforma-se em dor no corpo. Não tema, não se envergonhe, não se culpe… e peça ajuda!
Andreia Azevedo
Psicoterapeuta/Psicóloga
Coordenadora Clínica do/a Psivalor