A admiração e o deslumbramento pela beleza do nosso país aumenta sempre que vou conhecendo e explorando mais mundo além fronteiras. Portugal é um país encantador, que tem tanto de pequeno, como de contrastante. Sem realçar sequer a riqueza histórica, num mesmo território, à mesma hora, e à distância de uma viagem rodoviária inferior a 6horas, conseguimos ter serra, montanha e algum frio numa região e, noutro extremo, deparamo-nos com extensos areais, uma claridade intensa e calor.
Mas os contrastes estão longe de se esgotar no relevo ou no clima e tornam-se menos simpáticos quando comparamos, por exemplo o litoral com o interior. Ao analisarmos os principais indicadores demográficos ou económicos, a beleza vai-se, de facto, desvanecendo.
Quase 45% da população portuguesa reside nas áreas metropolitanas de Lisboa e Porto. É nessas regiões que se concentra a riqueza, os melhores equipamentos sociais, as acessibilidades e também a capacidade de gerar mais riqueza e, consequentemente, de atrair e fixar famílias, perpetuando um círculo virtuoso difícil de travar, que vai secando tudo o resto em seu redor.
E como fica o resto do território? O belo “interior” ou a “província” como, “carinhosamente”, alguns lhe chamam? Possui as tais paisagens bonitas, zonas tranquilas e a natureza no seu estado mais puro, que convida a visitar e a desfrutar para retemperar forças (mas quase sempre “de passagem” ou, quando muito, numa “escapadinha” de fim de semana apenas, porque as férias maiores são passadas mais a sul ou no estrangeiro). Infelizmente, a bela adjetivação que podemos atribuir a estas regiões, colide com as designações mais realistas que lhes estão associadas: territórios de baixa densidade, zonas deprimidas, desfavorecidas ou envelhecidas.
Os trágicos acontecimentos que assolaram recentemente alguns concelhos do nosso Pinhal Interior Norte trouxeram ao de cima a dura realidade das inúmeras fragilidades que estes territórios enfrentam e que (deem as voltas que quiserem dar) desembocam todas na questão económica!
A “indignação” coletiva, seguida de uma onda de solidariedade nacional e internacional, que se gerou em torno da reparação das terríveis perdas impostas a estas populações e territórios tem de perdurar o tempo necessário para que, não só, retornem rapidamente à normalidade possível, mas consigam também gerar o consenso coletivo que permita, finalmente, colocar em prática medidas estruturais (há muito identificadas) que travem e corrijam as desvantagens endógenas que possuem, sem ideologias políticas irracionais, bairrismos bacocos ou agendas pessoais a retardar ou inquinar a tomada das melhores decisões.
Assente no princípio mais básico da “união faz a força”, há que colocar em prática a fusão de concelhos pouco povoados, focada na obtenção de ganhos de escala, a transferir para os munícipes aí residentes (permitindo, por exemplo, dotar estas regiões de equipas de bombeiros sapadores e outros equipamentos sociais).
Veja-se o caso de Castanheira de Pera. Trata-se de um pequeno concelho (1 freguesia), com cerca de 2800 habitantes (um terço da população com mais de 65 anos), com uma capacidade de arrecadar e reter receita autárquica muito limitada e a braços com uma dívida gigante (que contraiu há alguns anos, aquando da construção do seu “grande” projeto turístico: a Praia das Rocas – investimento de viabilidade ainda hoje muito discutível) e que tem condicionado e continuará a condicionar, durante mais alguns anos, o seu desenvolvimento, se nada de diferente for feito.
E no que respeita à gestão da floresta? Perante a descuidada e perigosa “manta de retalhos” florestal, que é o minifúndio reinante, tem de ser seguida a mesma lógica: o emparcelamento tem de sair do papel, mesmo significando um maior esforço dos contribuintes!
Para além da solidariedade individual, que já deu imensas provas, se forem transmitidos alguns sinais sérios de que a mudança vai acontecer, há que apelar à responsabilidade social de muitos empresários e organizações e convidá-las a irem um pouco mais além dos donativos e do voluntariado dos seus colaboradores. Precisamos que invistam nestas regiões! Porque não?
Tudo isto vai exigir muito trabalho? Claro. Vão ser necessários referendos de resultado imprevisível, estudos, pareceres, consultas publicas, sessões de sensibilização etc., etc.. Vão surgir muitas resistências? Sem dúvida. É mais fácil ficar por uma vigorosa manifestação de intenções nesta fase e, quando tudo acalmar, logo se vê? Absolutamente.
Mas é este o momento em que cada decisor, cada munícipe destes territórios, cada proprietário florestal, cada contribuinte, enfim, cada um de nós, tem a oportunidade de mostrar que está disponível para fazer o que estiver ao seu alcance, para concretizar um objetivo coletivo maior: obter um Portugal menos desigual.
Como diria a minha avó Preciosa: “dizem que a beleza está no interior, mas eu acredito que também haja gente bonita no resto do país”!
O autor escreve na primeira quarta-feira de cada mês
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