As noites frescas lembram aquelas de um verão recentemente ido, num agosto cozinhado a-gosto. Culturalmente servido da forma possível, face às circunstâncias que nos toldam os sentidos. Bálsamo por entre os dias abafados que nos prendem em liberdade.
Foi no passado mês. Por momentos, a Praça Marquês de Pombal vestiu-se de luz e de cor para receber o Festival Sete Sóis Sete Luas, transportando-nos no abraço de sons e de vozes quentes para um mundo em que a Arte se eleva e nos conforta. A fusão de instrumentos tradicionais e a miscigenação cultural foram o expoente de noites que embriagaram o público, sedento de oportunidades desta natureza e de tamanha fertilidade.
Hoje, à distância dessas noites, ainda ouço dentro de mim os artistas agradecerem porque era o primeiro espetáculo que proporcionavam, ao vivo e com público, desde a clausura a que uma pandemia nos fez render. Revisito o espaço, agora mais despido e outonal, com cadeiras em desenhos geométricos que ditavam o desejável distanciamento físico, mas não o social.
Entretanto, também as portas do Teatro-Cine reabriram. Detive-me, por frações de segundo, sem descer as escadas. 6 de março, Be-Dom e uma sala lotada que aclamava, em êxtase. A última vez que havia ali entrado. Agora, despida, cadeiras solitárias e corpos afastados.
O Manobras – Festival Internacional de Marionetas e Formas Animadas também trouxe à Praça histórias e encantos, em fins de tarde mornos e precocemente anoitecidos, ensinando-nos que a vida é mesmo isso: uma faina permanente, um avançar e abrandar a marcha sempre que necessário for. Para inspirar e seguir.
Sim, a própria Arte teve de se reinventar e moldar, girando sobre si própria numa autodescoberta também ela sem precedentes. E tocou, sem tocar, como tantas vezes tem o dom de fazer. Persistente, como tão bem saber ser. Aprendamos com ela, manobrando estes tempos no devir coletivo que faz da nossa malha um verdadeiro tecido humano.