Todos nós gostamos de andar em autoestradas, quer seja pela comodidade, pela segurança ou por podermos andar mais depressa. Mas é bom que se diga que um carro que pese 1.000 kg, a uma velocidade de 140 km/h, faz uma força no pavimento de 20 ou 30 kg em cada roda. Basta, por isso, um pequeno vento lateral para voar literalmente. E isto ninguém ensina, nem aos condutores, nem aos políticos. Mas já não gostamos de andar em caminhos de pé posto. A menos que seja um passeio pelos trilhos, de preferência na Serra de Sicó. Mas tudo tem o seu tempo e o seu modo. Isso aconteceu ao País e às pessoas. Andámos, todos, demasiado tempo em autoestradas. Agora andamos todos em caminhos de pé posto. Todos? Todos não, mas a grande maioria. Um jornal de referência mundial referiu-se ao milagre económico de Portugal. O financeiro não é proporcional, já que a divida do País aumenta a cada dia que passa. Mas o jornal, também, foi dizendo que esse milagre deixou um rasto social devastador. Destruíram-se pessoas, que deveriam ser as primeiras das primeiras, a sua personalidade, a sua auto estima, a sua cultura, conduzindo-as a um submundo. Às catacumbas. Ou para debaixo das pontes. Destruíram-se empresas, culturas empresariais, postos de trabalho. A confiança. Todos desconfiam de todos. Ninguém confia em ninguém. Destruiu-se a economia doméstica de bens transacionáveis e tudo o que gira à sua volta. Será que o milagre económico de que nos falam compensa aquilo que foi destruído? É muito fácil destruir, mas é muito difícil construir. Hoje fala-se muito em apoiar a exportação para salvar a Pátria. Mas que exportação? A dos nossos quadros, técnicos e o seu saber? O saber, o saber saber, o saber fazer e o saber estar, sabe-se que foi para outras paragens. E o que resta? O milagre? O jornal oficial da República publicou ontem, 17 de Fevereiro, um Decreto-Lei sobre o que chama o “sorteio da fatura da sorte”. É uma sorte não pertencermos ao terceiro mundo, se não seria o sorteio da fatura da não sorte. A velha Álbion ainda hoje se ri da sorte que lhe demos quando negociámos a autorização da pesca do bacalhau, nas águas frias, que nem eram suas, contra dar-lhes o que de melhor tínhamos, desde o Vinho do Porto às lãs. Nunca mais aprendemos, meu Deus. Buscamos a exportação, o investimento estrangeiro e destruímos a economia doméstica de bens transacionáveis. Transferimos para outros o valor acrescentado dado aos produtos. Transferimos para outros o saber e o saber fazer. Vá-se lá saber porquê? Ajustámos a economia do País à custa da destruição de pessoas, de postos de trabalho, de empresas. A que custo social?Soubemos, agora, que o Senhor Professor Doutor Vítor Louçã Rabaça Gaspar, em livro, vem reclamar para si o milagre económico do País. Uma moeda tem sempre duas faces. Ficámos a saber quem era o responsável pela feitura de uma das faces. A boa, no seu dizer. E gostávamos de saber quem é o responsável pela construção, destruição, da outra face. A má, no nosso dizer. Será, mesmo, que o País está no bom caminho? Tenho pena do meu amigo pessoal Pedro Manuel Mamede Passos Coelho que está a ser enganado. Não se faz.
Rodrigues Marques