O caminho que meio milhão de portugueses escolheram para alcançarem o sucesso custou apenas 15 paus. Este é o preço de capa do livro de auto-ajuda “O Segredo”, de Rhonda Byrne. A autora, através de uma linguagem aclimatada ao intelecto dos seus potenciais leitores, grosso modo, diz que para atingir o sucesso basta querer. Querer com muita, muita força! Pelo meio, verte uma fieira de vivacidades que todos gostamos de ouvir. Talvez o segredo destes livros de auto-ajuda seja esse mesmo: ouvir (neste caso, ler) o que gostamos de ouvir. Este género literário (o banhadacobrismo) tem procriado incomensuráveis best-sellers. Há para todos os gostos: “Como fazer amigos”; “A ciência de ficar rico”; “As sete leis fundamentais do sucesso”; “O poder do pensamento positivo”; A lei do triunfo”; etc. etc… Como nenhum de nós é ou tem aquilo que deseja, muitos (MESMO MUITOS) caem na tentação de gastar uns euros na esperança que o firmamento se conjugue a seu favor.
Tal como as grandes obras literárias, também o género banhadacobrista extrapolou a dimensão do papel e já invade as telas e os palcos. Presenciamos uma proliferação desabalada de vídeos e palestras de auto-ajuda. Estas últimas constituem eventos particularmente deprimentes: um tipo bem-parecido, com um sorriso e uma mimicaria à propagandista de feira, entorna um conjunto de frivolidades (muitas delas decalcadas de adágios populares) perante uma plateia de crédulos papalvos. Apesar de não gastar, reconheço que estes sucedimentos produzem um poderoso encanto em determinados públicos. Veja-se o caso da Junta de Freguesia de Pombal que já organizou por duas vezes acontecimentos desta natureza (à segunda, só cai quem quer!).
De entre os livros de auto-ajuda de maior sucesso conta-se a “A arte do namoro”, de Susan Rabin e Barbara Lagowski. Compreende-se. Para além da obsessão pelo dinheiro, pelo reconhecimento e pela saúde, para completar o condito da felicidade fica a faltar o AMOR. AHHH! O AMOR… O humano civilizado sempre se sentiu atormentado pela elementar questão romântico-filosófica: como dar o primeiro passo sem parecer desesperado ou sexualmente agressivo? Este angustiante dilema explica facilmente a sucessão de edições do compêndio ao qual me refiro.
Uma das singularidades da condição humana determina que, em aflição, somos capazes de recorrer a tudo. Mesmo ao que, noutras alturas, nos possa ter nauseado. Apesar de não possuir estatísticas fiáveis, calculo que esta “A arte do namoro” possa ter aumentado as suas vendas nestes últimos tempos. Não pela nossa natural fantasia de uma paixão estival, mas pelo acotovelamento frenético que normalmente caracteriza o período antecedente à constituição das listas de candidatos à Assembleia da República.
No dia 6 de Outubro vamos eleger os nossos 230 representantes na casa da democracia. Os lugares de deputados de cada um dos 22 círculos eleitorais são atribuídos segundo critérios de proporcionalidade de acordo com o seu número de eleitores. Assim temos que os círculos mais populosos (Lisboa, Porto, Braga, Setúbal e Aveiro) elegem cerca de 60% dos deputados. Para além disso, as estruturas centrais dos partidos ainda chamam a si a validação das listas propostas pela distritais e, muitas vezes, até impõem gente de outras paragens para integrar essas listas, em lugares elegíveis. Assim, os pequeninos vão ficando cada vez mais pequeninos e a falar baixinho.
Por esta ordem de razões, os aspirantes a deputados dos círculos de menor representação são obrigados aos mais engenhosos exercícios de sedução e contorcionismo político para conquistarem o “coração” dos decisores da sua cor. Qualquer arrimo mal calculado e PIMBAAA!!! Estão fora-de-jogo. Isto, obviamente, não será tão verdadeiro para os círculos eleitorais mais representados, nomeadamente, Lisboa e Porto. Aqui cabem, não só os perseverantes (como deviam ser todos), mas também os que pompeiam um apelido valedouro ou os que têm mais inclinação para o lobbismo (estes estão lá sempre batidos!).
Lembro-me de uma reunião que tive há uns anos com um deputado da Assembleia da República (não, certamente, os que poderão estar a pensar) que me disse: “Aníbal, na política não contam as ideias. Contam os apoios!”. Sustive a ideia com desencanto. Detive-me a pensar sobre até que ponto é que flanar no cosmos da política nos outorga probidade. Até que sevícia enodoa estaremos dispostos a ir neste oclusivo jogo de sedução. Acredito que muitos dos que nos representam são gente digna e capaz. Mas tenho, igualmente, a convicção que haverá outros tantos em que, no seu imo, vive uma PEQUENA E DISSOLUTA MESSALINA.
Aníbal Cardona
Consultor/Formador
*O autor deste artigo gostava que os pensadores do novo acordo ortográfico lessem o livro “Descomplica”, de Sofia Castro Fernandes.