Il buono, il brutto, il cativo é o título original do clássico western spaghetti dos anos 60: O bom, o mau e o vilão. Ao que me lembro do enredo, a história passa-se no Velho Oeste durante a Guerra Civil Americana, e trata da demanda de três pistoleiros em busca de um tesouro enterrado num cemitério. Nenhum deles possui informação suficiente para encontrar o tesouro sozinho. No entanto, têm a noção de que juntando o que cada um sabe, será possível alcançar o objectivo. Cria-se assim, entre eles, um clima de simbiose circunstancial. Não confiam uns nos outros. Nem tão-pouco se topam. Ao longo de toda a trama vai-se formando na cabeça de cada um, um plano para passar a perna aos parceiros de situação. Uma conclusão que é possível tirar nos primeiros minutos do filme é que, apesar de tanto o título original como as traduções portuguesa e inglesa aludirem a que um deles é bom, facilmente verificamos que nenhum é na realidade uma jóia de moço. São todos assassinos sanguinários, apesar de um deles demonstrar algum titilado antes de cometer o occídio. Na prática, o resultado é o mesmo: ao longo das mais de duas horas de filme, liquidam, por igual, uns quantos (muitos).
Apesar de muito menos divertidos, alguns protagonistas da política pombalense fazem lembrar os personagens da obra-prima de Sergio Leone. Não exactamente por serem particularmente carismáticas, como Clint Eastwood ou Lee Van Cleef, mas por ser cada vez mais evidente que a convivência entre elas não difere substancialmente da dos três pistoleiros. Outra semelhança prende-se com o facto de estarem também dispostos a suportarem-se em nome de um bem maior. Não um tesouro enterrado num cemitério, mas a manutenção do poder. AHHHH!!!! O PODER… Esse substantivo tão nutritivo… Quando não o possuímos, já é bom mantermo-nos perto dele. Para isso, é preciso ser obediente e recalcar todo e qualquer vilipêndio que nos obsequeiem. Sabemos que uma atitude mal interpretada pode transportar-nos ao degredo.
Um observador mais atento já percebeu, há muito, que é neste ambiente de trepidez que vagueiam os afins do poder reinante. No entanto, apesar da magnitude das tricas e dos enxovalhos, tudo se tem mantido dentro da mais pia reserva. Estranhamente, nos últimos tempos, os queixumes, outrora vertidos em surdina, já vislumbram a luz do sol (algo há pouco impensável). Será que as afrontas subiram insuportavelmente de tom? Será que, à semelhança dos malfeitores da história, que planeavam empandeirar os comparsas logo que o tesouro fosse encontrado, já existem proscritos? Será que se descortina no horizonte uma outra ordem?
Não tem sido só em relação aos amores e desamores das figuras do regime que se tem observado uma quebra do voto de discrição. Também em relação ao plano pacóvio (mas que tem resultado em cheio) de controlar tudo o que mexe. Dantes as coisas eram feitas com algum prurido e circunspecção. Há uns tempos para cá, perdeu-se absolutamente o pejo. Será que por inabilidade de quem arquitecta estes planos? Ou será porque que já se está tão à vontade que nem interessa sequer o que de fora se possa pensar?
Aprecio particularmente uma frase atribuída a Abraham Lincoln: “Se quiseres pôr à prova o caráter de um homem dá-lhe poder”. Esta reflexão levanta uma intemporal questão filosófica: para que serve o poder? Uma verdade parece cristalina: Pombal continua distante do que um concelho do litoral, com uma invejável situação geográfica, com uma assinalável diversidade morfológica do seu território, com um substantivo contexto cultural e histórico, poderia ser. Nomeadamente, quando nos aproximamos do final do primeiro quartel do século XXI. Talvez sejamos mais um exemplo da corrente político-filosófica responsável pelo facto de mais de metade dos eleitores nem se dar ao trabalho de votar: O PODER SERVE PARA SER MANTIDO!
Aníbal Cardona
Consultor/Formador
*O autor deste artigo acha que quem pensou o novo acordo ortográfico devia ter ido a um saloon e entornado um copo cheio de whiskey em cima do bom, do mau e do vilão. BANG BANG, BANG BANG…
Artigo de opinião publicado na edição impressa de 11 de Abril