O Soldadinho

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O Capitão Menezes Ferreira, no seu livro João Ninguém, publicado em 1921, afirma que o escreveu para glorificar os heroicos soldadinhos de Portugal que participaram na Grande Guerra. Prometemos não falar mais da Grande Guerra até ao dia 11 de Novembro de 2018, por ocasião da comemoração do Centenário da assinatura do Armistício que pôs fim à guerra, com a capitulação da Alemanha. No volume 7 da colecção sobre a Primeira Grande Guerra, que o Expresso tem vindo a oferecer aos seus leitores, Rui Cardoso escreve:
“Quando, em Agosto de 1914, soaram os primeiros tiros de canhão no centro da Europa a última coisa de que Portugal precisava era de uma guerra. O país tinha problemas que chegassem. A República ia entrar no seu quarto ano de vida mas era, como hoje se diria, um projeto adiado: a situação da economia e das finanças públicas era tão desastrosa como no tempo da monarquia, as promessas de uma vida melhor, nomeadamente para as classes trabalhadoras, não tinham passado disso mesmo e o sistema político revelava-se incapaz de gerar governos duradouros, capazes de aplicar políticas de médio prazo”.
Uma fotografia com 100 anos.
Hoje vemos os sábios conselheiros do legítimo Governo da República a aconselhá-lo a destruir a economia doméstica de bens transacionáveis para criar uma nova ordem. Não sabem bem qual, mas dizem que é necessário uma nova ordem. As finanças públicas estão no bom caminho, dizem. As pessoas estão espoliadas, desmotivadas e sem esperança no futuro. O medo e a desconfiança estão instalados. Os sábios conselheiros do regime obrigam os ministros a dizer de manhã uma coisa e à tarde o seu contrário. É uma trapalhada. O maior partido da oposição anda à zaragata interna, com murros à mistura. Outro luta por ver a terra queimada, encontrando terreno propício para isso. O outro, coitado, é bicéfalo. Outro, ainda, é satélite dos comunistas. Estamos entregues à bicharada. O País cada vez deve mais ao estrangeiro. A riqueza produzida no País cada vez é menor e a pouca que é produzida é mal distribuída.Por mor dos nossos pecados, temos observado o trânsito na nacional um, a actual coluna dorsal do trânsito de mercadorias. Se tivermos em conta a regra dos 80-20, deveriam aí circular 80 % de carros de carga e 20 % de carros ligeiros de passageiros, para que a economia real funcionasse. Mas, pelas nossas contas e de uma forma empírica, afirmamos que a circulação de mercadorias deve andar nos 60 %, ou menos. Muito longe do que deveria ser. Pensamos que não estamos a ser injustos quando fazemos estas contas e onde as fazemos. O 25 de Abril apanhou o IV Plano de Fomento ainda no papel e aí estava consignada a beneficiação da nacional dois, de Chaves a Faro, que, essa sim, deveria ser a coluna dorsal da rede viária nacional. Todavia o projecto foi abandonado e ficaram 50 km, ou menos, de “terreno arável” junto ao litoral, com duas auto-estradas paralelas. Todo o resto do País é para desertificar. No mesmo Plano de Fomento estava o incremento do caminho de ferro, prioritariamente para o transporte de mercadorias, também ele abandonado. Só temos assistido a tácticas, sem nenhuma estratégia. Como são só tácticas retirar o dinheiro às pessoas e às empresas para equilibrar as cada vez mais desequilibradas finanças públicas e a que os sábios chamam reformas. O que fazer?
Neste momento andamos a ver se alcançamos saber o que é que o nosso avô Felizardo Simões andou a fazer, dois anos, pelas terras de ninguém, na Grande Guerra. Havemos de lá chegar e saber quantos felizardos simões lutaram por causas que não compreendiam. O heroico soldadinho português está no limite da sua capacidade de dar o seu óbulo, não sabe bem a quem e nem o porquê. Mas sabe que o óbulo que lhe é exigido já vai a caminho do seu oitavo ordenado. E questiona-se das razões pelas quais os sábios do regime não conseguem encontrar soluções equilibradas para salvar o País sem matar as pessoas, como os alemães fizeram aos nossos soldadinhos, na Batalha de La Lys, em Abril de 1918.
Coitado do soldadinho português.

Rodrigues Marques