As empresas familiares portuguesas, à semelhança do que acontece na maioria dos países europeus, são a base predominante do nosso tecido empresarial e os dados disponíveis sobre a importância deste tipo de empresas é inegavelmente relevante no contexto empresarial, uma vez que 80% das empresas nacionais são de cariz familiar e sobretudo PME., geram 60% do PIB português, são responsáveis por cerca de 50% do emprego.
Para além dos desafios que todo o setor empresarial enfrenta, as empresas familiares, invariavelmente, deparam-se com o problema da sucessão e os números demonstram-no claramente pois 50% das empresas familiares não passam para a segunda geração e apenas 20% consegue atingir a terceira geração.
É por isso que hoje, mais do que nunca, para além de enfrentar o provável arrefecimento económico pós-pandémico, as empresas familiares devem antecipar e preparar não só a sua rota empresarial, mas também o seu rumo sucessório, contrariando as estatísticas e procurando preservar postos de trabalho e um desenvolvimento económico sustentado, sobretudo nos territórios mais desprotegidos e onde se impõe a diminuição de assimetrias sociais.
Apesar de em Portugal a literatura sobre a matéria ser ainda escassa, a Associação Empresarial de Portugal desenvolveu um projeto denominado “Livro Branco da Sucessão Empresarial” que, para além do diagnóstico da realidade portuguesa, traça uma visão de futuro para a necessidade da transposição de boas práticas que são já uma realidade, por exemplo, em Espanha. Ao passo que em Portugal não existem praticamente normas jurídicas destinadas especificamente às empresas familiares, no país vizinho já existe um conjunto de normas que visam estabelecer as condições, a forma e a publicidade através do registo comercial, de acordos parassociais, denominados protocolos familiares e que algumas conhecidas empresas familiares já adotaram, como é o caso da Jerónimo Martins e da Salvador Caetano.
À semelhança de outros países algumas das empresas familiares portuguesas começam por estabelecer um Conselho de Família, que se define por um órgão de governo familiar e nele, estabelecem um Protocolo Familiar, isto é, um contrato parassocial assinado por todos os membros da família “regulador das relações entre os vários elementos da família e a sua relação com a empresa, seja do ponto de vista da gestão empresarial, seja do património familiar” mas que imperativamente não pode colidir “com o exercício e atividade dos órgãos de governo, definida e regulada nos termos da lei e do contrato de sociedade.”
O protocolo familiar funciona assim como um código de conduta, um mecanismo de mediação e negociação de conflitos, “visando limitar o poder da família em favor do sucesso da empresa familiar.”
Apesar da dimensão e importância do setor (cerca de 350 mil sociedades) o legislador português ainda não produziu regulamentação autónoma sobre o protocolo familiar ou qualquer outro mecanismo que ilumine a transição e sucessão entre gerações de empresários que estão assim sujeitos às mesmas regras que as demais sociedades comerciais restando-lhes apenas, ao abrigo do princípio da liberdade contratual, a redação de contratos e cláusulas que, precavendo o futuro, correspondam, simultaneamente, aos interesses familiares e da sociedade comercial.
Não obstante, o certo é que em matéria de direito sucessório o, inovador, protocolo familiar não prevalece sobre as regras da sucessão legitimária, ou seja, o contrato não se sobrepõe aos superiores interesses da família previstos na lei sucessória.
Resta por isso aos pequenos e médios empresários de Portugal incluídos, muitos deles, nos 80 % de empresas familiares, acautelarem o futuro, a sucessão e com eles o provável sucesso familiar e empresarial, até porque nos termos do Código Civil, podem optar pela Partilha dos bens em vida, prevista no artigo 2029º, fazendo “doação entre vivos, com ou sem reserva de usufruto, de todos os seus bens ou de parte deles a algum ou alguns dos presumidos herdeiros legitimários, com o consentimento dos outros, e os donatários pagam ou se obrigam a pagar a estes o valor das partes que proporcionalmente lhes tocariam nos bens doados.”, ou pelo Testamento, sobretudo na forma de Legado e assim garantirem uma divisão patrimonial justa e equitativa, quer do património predial, quer do património social, mas também condizente com a vontade dos doadores, testadores e quase sempre pais, que assim, em vida, impõe uma vontade que assegura uma transição geracional pacífica e equilibrada e que tende à eliminação de eventuais conflitos de personalidades e interesses na família consanguínea e por afinidade e com isso fortalecer a estrutura familiar garantindo que os negócios familiares perduram nas gerações que lhes seguem.
Tudo porque, afinal de contas, para além da manutenção dos postos de trabalho, geração de riqueza e desenvolvimento dos territórios, o mais importante nas empresas familiares é garantir-se a saúde familiar.
Leandro Siopa
Solicitador CP 4598
Fontes:
“Livro Branco da Sucessão Empresarial- O desafio da sucessão empresarial em Portugal-AEP, 2011”
“Dissertação- Empresas familiares, reflexão sobre o seu governo e sucessão, Joana da Silva Leal, Universidade Católica Portuguesa-2011”
*Artigo de opinião publicado na edição impressa de 6 de Abril, integrado num DESTAQUE sobre as PME Líder 2020 do concelho de Pombal