No início do mês de março, mais precisamente no dia 2 de março, fez dez anos que mais de um milhão e meio de portugueses saíram à rua num movimento chamado “Que se lixe a Troika”. Um protesto que se estendeu a cerca de 40 cidades, as pessoas saíram para as ruas de Portugal e não só, gritar “basta” de austeridade e pedir a demissão do Governo de Pedro Passos Coelho.
Dez anos depois, creio que é uma boa altura para fazer uma retrospeção do que se passou e do que se está a passar.
Ora, desde então as pessoas não saíram à rua (ou pelo menos que me recorde) num movimento similar. É sinal que as coisas estão melhores desde então, correcto? Bom, o que importa é ter saúde. E de facto é bom que assim seja, pois o nosso SNS está pelas ruas da amargura. Depois das notícias das urgências da pediatria, obstetrícia/ginecologia estarem encerradas, também fomos presenteados com o fecho da urgência de ortopedia do Hospital de Santa Maria, o maior hospital do país, no dia 4 de março, reabrindo às 8h00 do dia seguinte, sendo que um grupo de médicos internos e especialistas já tinha avisado para a possibilidade de constrangimentos ao longo do mês de março. Ou seja, poderá não ser caso único este fecho da urgência de ortopedia. Aliás, o grupo alerta que em 20 dos 31 dias do mês de março não existem condições para manter aberta esta urgência.
Mas não é tudo. Na quarta-feira dia 1, demitiram-se os chefes do serviço de urgência geral do Hospital Beatriz Ângelo, que outrora fora um hospital modelo e revolucionário na abordagem e gestão dos doentes, vive agora um dos piores momentos da sua história. Mas o que se passou para passar por este momento?
Recordemos, fez agora no dia 18 de Janeiro um ano que desde terminou a parceria público-privada. Foi durante 10 anos, desde 2012 até 2022 gerido por privados, mais precisamente a Luz Saúde. E desde o término da parceria que o hospital herdou os problemas do SNS, os utentes queixam-se de tempos de espera mais longos e a degradação dos serviços.
Os clínicos que apresentaram a demissão, vão continuar em funções até o hospital encontrar uma solução, contudo a urgência da pediatria encerra à noite entre às 21h e às 9h e também ao fim de semana. O que vale é que nada se passa à noite.
Mas com isto podemos ver o quão perigoso é uma ideologia. Muito queriam terminar com as parcerias público-privadas (PPPs), que davam provas de eficiência e benefícios para as contas públicas, mas por estarem sob gestão de privados (esses malvados capitalistas!), tiveram que terminar. Não faz sentido.
Também podemos ver qual é o custo de uma ideologia. As PPPs, na última década, geraram poupanças de 203 milhões de Euros. Já o orçamento do Hospital Beatriz Ângelo do ano passado para os dias de hoje subiu: em 2022 custou 130 milhões e este ano já custou mais seis milhões. E agora a PPP volta a ser posta na mesa como uma solução. Ora ora, equacionar reverter a parceria é reconhecer que esta era precisa, que era uma mais valia e que foi uma trapalhada terminar com ela.
Assim questiono-me: com tudo o que se passou neste governo, com os escândalos que vão surgindo, com as demissões que ocorreram, com medidas absurdas anunciadas pelo governo (Exemplo os pacotes Mais Habitação e Famílias Primeiro), o que mais falta para as pessoas saírem à rua e gritar “Basta!”, à semelhança do que fizeram há 10 anos? Bom, ao menos temos de volta todos os feriados que o Passos Coelho nos tirou.
Cristiana Areia
Engenheira Química | Membro da Iniciativa Liberal Pombal