Na queijaria Prado da Sicó, a facturação sofreu uma quebra na ordem dos 40 por cento e a empresa viu-se obrigada a recorrer ao lay-off simplificado para salvaguardar mais de quatro dezenas de postos de trabalho. Mesmo assim, a unidade fabril não esquece as famílias que estão a passar por dificuldades e avançou com uma campanha de oferta diária de queijos.
Desde que as notícias sobre a pandemia causada pelo novo coronavírus passaram a estar na ordem do dia, a queijaria Prado da Sicó, em Santiago da Guarda, sentiu de imediato os efeitos das medidas de contingência decretadas pela Direcção-Geral da Saúde. “Começámos logo a ter encomendas canceladas”, motivadas pelo encerramento dos mercados tradicionais e do sector da restauração, conta Liliana Sá, filha dos sócios-gerentes da empresa do concelho de Ansião.
A receber leite dos produtores “praticamente todos os dias”, a empresária diz que o primeiro passo foi encontrar soluções para escoar a matéria-prima que não era canalizada para a habitual produção de queijos. “Não podíamos transformar o leite todo, porque vimos que não tinha saída”, conta Liliana Sá, e a solução encontrada foi “encaminhar o leite para secar numa empresa, em Espanha”, uma vez que em Portugal não existia qualquer tipo de resposta a este nível.
Com quebras significativas nas vendas, foi preciso, também, sensibilizar os próprios produtores de leite para a necessidade de reduzir a produção. E é neste campo que reside uma das grandes preocupações manifestadas por Liliana Sá. Se ao nível do queijo a Prado da Sicó conseguiu ajustar a produção para minimizar o efeito negativo da quebra nas vendas, o mesmo não se poderá dizer do impacto junto dos produtores de leite, onde se concentram “os maiores prejuízos”, adverte aquela responsável. “Todos eles já viviam com dificuldades, não têm os apoios que deviam ter e, com uma situação destas, não sabemos se vão resistir”. Além disso, os que conseguirem sobreviver a esta ‘hecatombe’ “vão ficar com sequelas, porque têm que reduzir a produção dos animais”, lamenta a empresária. “Daqui a alguns meses não vamos ter a mesma produção de leite, mesmo que queiramos”, o que augura um regresso “muito difícil à normalidade”.
Produção a 20/30 por cento do habitual
Com um nível de produção na ordem dos 20 a 30 por cento do habitual, a queijaria encaminha actualmente, para secagem, cerca de 70 por cento do leite de ovelha e 60 a 70 do leite de cabra que continuam a chegar à unidade fabril. Com boa parte da cadeia de revendedores de portas fechadas, o queijo produzido é agora absorvido sobretudo pelo pequeno comércio, onde se incluem, também, os talhos.
Perante esta realidade, e com uma equipa de 45 colaboradores, a Prado da Sicó viu-se obrigada a socorrer-se das medidas de apoio disponibilizadas pelo Governo. A empresa salvaguardou os postos de trabalho, mas recorreu ao lay-off para fazer face às quebras na facturação, que já atingiram os 40 por cento. Deste grupo de colaboradoras, algumas delas estão em casa a dar assistência aos filhos e outras em gozo de férias.
Quanto às medidas de contingência, têm vindo a ser ajustadas em função do agravamento do surto epidemiológico. Numa primeira fase, para além do acesso restrito à fábrica, a queijaria implementou medidas de higiene e desinfecção ainda mais apertadas do que as habituais, extensíveis aos colaboradores, a quem foram feitas recomendações não só ao nível da higiene, mas também dos equipamentos de protecção individual, explica Liliana Sá.
Mais recentemente, a empresa procedeu a nova actualização do plano de contingência e dividiu os colaboradores em duas equipas que trabalham, deforma alternada, semanalmente. A equipa que está de serviço durante uma semana permanece em casa no período seguinte, e assim sucessivamente.
Campanha solidária
Numa altura em que muitas famílias atravessam dificuldades acrescidas, a Prado da Sicó decidiu pôr em marcha uma iniciativa solidária. Desde meados de Março, a loja da queijaria tem à disposição dos clientes um saquinho com vários queijos de oferta. “Pode pegar e levar. Vai ficar tudo bem”, diz a mensagem ali colocada. “Já fazíamos algumas promoções na loja de queijo com algum defeito”, recorda Liliana Sá. Perante a actual situação pandémica, “começámos a perceber que se já havia pessoas que tinham dificuldades, neste momento estariam a passar por muitas mais, e entendemos que podíamos dispensar parte desse queijo que já não está tão facilmente vendável, mas que está óptimo para consumo”, explica a empresária. “Achámos que não nos prejudicava em nada e que poderíamos ajudar outras pessoas”.
A iniciativa não tem data de término marcada, “e enquanto entendermos que temos queijo que podemos dispensar, vamos continuar”, afirma a mesma responsável, que garante que, desde então, o feedback tem sido “óptimo”. Além disso, a campanha tem trazido mais clientes que acabam por comprar outro tipo de queijo e, dessa forma, estão também a ajudar os produtores de leite.
*Notícia publicada na edição impressa de 16 de Abril