É na tranquilidade de uma casa isolada, na freguesia de São Simão de Litém, que Telmo Mendes passa grande parte dos seus dias. Depois de recuperada a habitação, a que deu funcionalidade, voltou a meter mãos à obra e tem, quase pronto, um estúdio e laboratório, onde dá asas à sua grande paixão: a fotografia. Foi lá que o visitámos para o ouvir, entusiasticamente, falar sobre as suas experiências e os processos fotográficos antigos que teima em trazer para o presente.
Telmo Mendes sempre viveu rodeado de câmaras fotográficas e laboratórios de fotografia. É algo que lhe vem da família, sendo filho e neto de fotógrafos comerciais. Não foi assim estranho que, na sua formação, tivesse seguido por esta área. Primeiro em Lisboa, na ETIC – Escola de Tecnologias Inovação e Criação, e depois em Tomar, onde se licenciou no Instituto Politécnico local. Contudo, não é propriamente a fotografia comercial que o move. Desde cedo que começou a realizar experiências e, hoje em dia, dedica-se quase exclusivamente à investigação e divulgação de técnicas de processos fotográficos históricos e processos experimentais. É nesta redescoberta das técnicas primitivas da fotografia que “homenageia os ancestrais inventores desta arte”. Quer esteja isolado, no espaço que concebeu na sua casa; ou mostrando essas técnicas, em demonstrações, formações ou workshops, como fez recentemente na Casa Varela – Centro de Experimentação Artística.
Foi com visível orgulho que Telmo Mendes nos recebeu no seu novo espaço, onde acabámos por ser os primeiros “humanos” a ser retratados, usando o processo do colódio húmido, mais concretamente na versão ambrótipo, por a impressão ser feita numa placa de vidro. Esta é uma técnica nascida em 1851, pelas mãos do britânico Frederick Scott Archer, que viria a substituir os processos fotográficos mais antigos, como o daguerreótipo, por necessitar de menos tempo de exposição e ser mais resistente ao tempo.
É a ela que o fotógrafo tem dedicado grande parte dos seus estudos. É mesmo um dos únicos fotógrafos do país a usar este método, sendo que é o próprio que prepara praticamente todo o material, desde o corte do vidro onde se vai fazer a impressão das fotografias, até aos reagentes que são necessários para todo o processo. Telmo Mendes explica que começou a aprender este processo, em Tomar, em 2007, com o professor Luís Pavão. O termo colódio húmido é devido ao facto das placas terem de permancer húmidas ao longo de todo o procedimento. O colódio é uma espécie de verniz que é aplicado nas placas de vidro, que são depois mergulhadas em nitrato de prata para ficarem fotossensíveis. Para a captação da imagem, Telmo Mendes usa apenas a luz natural, ajustando o tempo de exposição às condições da luz. “Toda a preparação é feita artesanalmente”, diz Telmo Mendes, “desde a parte química, ao revelador e ao fixador”. “Sou uma espécie de cientista-artista”, ironiza este verdadeiro “artesão da fotografia”. O resultado final é uma impressão em vidro, que faz as delícias de quem é fotografado, quando a “magia” se revela naqueles segundos em que o líquido revelador é vertido sobre o vidro e a imagem começa a aparecer.
“Sou uma espécie de cientista-artista”
A criação do seu estúdio, na aldeia da Barrosa, em São Simão de Litém, era uma pretensão antiga de Telmo Mendes. “Por vezes era contactado e não tinha um espaço próprio para receber as pessoas”, confessa o fotógrafo. Aproveitando o período da pandemia, fez a reconversão de um anexo que existia junto à sua habitação, “para poder fazer esses retratos que as pessoas me pedem, porque as condições nem sempre permitem fotografar no exterior”. Agora já pode atender a esses pedidos, enquanto continua a aperfeiçoar a técnica e a explorar os processos fotográficos do século XIX.
Nuno Oliveira
*Notícia publicada na edição impressa de 6 de Abril