Muito se tem falado da reforma do sistema politico e da necessidade latente de devolver à política a credibilidade que lhe parece estar a “fugir”. Aproximar os eleitos dos eleitores e criar entre estes as pontes que permitam o encurtar da distância que os separa (que cada vez mais os separa). Sendo que a necessidade/problema é por todos facilmente identificável e absolutamente consensual, o mesmo não parece acontecer quer com a causa, quer com o método a aplicar na resolução. Queremos mudar os políticos (correr com estes e colocar lá outros) ou mudar a imagem que as pessoas têm dos políticos? Queremos reforçar a importância do voto ou fomentar um maior interesse pelo voto? Achamos que o voto é um direito ou é afinal um dever cívico?
A mim parece-me óbvio, o voto é uma obrigação cívica e um dever para com o colectivo. É a parte que cabe a cada um de nós na definição do futuro comum em sociedade. Se somos cidadãos de plenos direitos, direitos que decorrem da actividade politica que nos rege e dos quais não abdicamos (nem que seja por imperativo legal), não será igualmente justo que sejamos cidadãos de plenos deveres? Ou seja, se aceitamos (e queremos) viver em democracia e essa mesma democracia assenta a sua legitimação na participação de todos, será “legítimo” que haja quem se queira manter afastado desse seu papel? Se é legítimo beneficiar de um sistema no qual me recuso a cumprir a minha parte?
O ponto da discórdia aqui é a definição da importância do voto, se este é afinal um direito ou um dever que tenho? Se é uma questão de responsabilidade pessoal ou uma questão de responsabilidade colectiva em que cada um tem uma igual parcela de responsabilidade? … Se consideramos o voto como um mero direito opcional, passível de ser exercido ou não, porque damos tanta relevância ao facto de muita gente não o querer fazer? Não será igualmente natural o acto de votar e o acto de não votar? Então porque nos desdobramos em análises, interpretações e grandes discursos em defesa do voto se continuamos a ditar que a sua “importância” é relativa – leia-se: opcional?
A minha opinião é simples: o voto é um dever que todos temos de cumprir. Não creio que a importância do elemento decisor da vida futura de uma sociedade, possa ser encarado de forma opcional. Não estou com isto a dizer que as pessoas devem todas votar neste ou naquele partido mesmo que não se sintam representadas, nada disso. Existe para esse efeito a figura do voto em branco ou a figura do voto nulo, ninguém é obrigado a votar em quem não quer, nem ninguém fica privado de manifestar a sua indignação. O que levanta uma questão muito simples: o que falta consagrar no acto do voto que possa ser consagrado através do não voto? Mais, se todos os cenários estão consagrados e todos assumimos que o voto é absolutamente fundamental para a nossa vida em comunidade e para o nosso sistema democrático, porque o mantemos opcional quando a opção de não o fazer apenas se traduz numa variável muito menos clara e absolutamente especulativa?
Por outro lado, não seria também esta uma forma de “obrigar” as pessoas a manterem-se mais atentas e interessadas sobre as decisões que nos afectam a todos? De combater o desleixo e o alheamento? Será que o facto de se dizer que algo é opcional não infere sobre a percepção de importância que cada individuo lhe atribui?
Mais tarde ou mais cedo… vamos ter de pensar sobre isto.
Pedro Brilhante
(Impresso na edição nº 30)